O Passatempo do Ego
O debate já dura há demasiado tempo para que uma opinião uniforme ainda não tenha sido encontrada. Será legítimo nomear cidadão-jornalista alguém que está no sítio certo à hora exacta, que tem um blogue ou um outro espaço de livre opinião, que denuncia o arrufo lá do bairro ou que apenas serve de ponte de infomação?
O conceito é polémico e os teóricos desdobram-se em prós e contras quanto ao mérito desta nova classe de cidadãos comuns que se dedicam, com maior ou menor empenho, à recolha e transmissão (opcional) de informação.
A verdade é que vários órgãos de informação já dispensam alguma importância a este grupo cada vez menos restrito de indivíduos. O serviço de informação norte-americano MSNBC já montou o seu espaço destinado aos Citizen Journalists, a Folha Online do Brasil seguiu o mesmo caminho e nomeia-os jornalistas comunitários, o diário espanhol 20 Minutos convidou formalmente os seus leitores a assumirem-se como correspondentes efectivos e até mesmo a Wikipedia criou o serviço Wikinews onde qualquer engenheiro se torna jornalista em tempo real e, melhor que tudo, sem o incómodo controlo editorial. Não fosse a presunção suficiente, este serviço pretende, segundo a própria Wikipedia, tornar-se a médio prazo uma alternativa eficaz às agências de informação actuais.
Não menos verdade é que esta actividade não só é patrocinada como também incentivada. O Sindicato dos Jornalistas Britânicos prepara-se para lançar o primeiro código de ética do cidadão-jornalista, a Creative Reporter paga ao cidadão para escrever enquanto a J-Learning lhes vai ensinando o pouco que precisam para construirem a sua própria publicação.
Enquanto a moda ainda o é e as oportunidades de jornalismo aberto vão proliferando - nomeadamente na Internet -, muitas questões se levantam quanto à legitimidade deste passatempo. Sendo certo que os blogues possibilitam e popularizam o conceito do cidadão-jornalista, serão os mesmos (os blogues) exemplos de jornalismo? Serão os bloggers jornalistas? Serão estas pessoas capazes de produzir conteúdos informativos facilmente perceptíveis e suficientemente descritivos ao leitor?
É com convicção que nos colocamos ao lado dos que respondem NÃO. Nunca um indivíduo comum, sem formação especializada ou sem uma experiência considerável no meio poderia recolher legitimidade para produzir informação e transportá-la rigorosa e factualmente para o leitor. Nunca um blogue terá o credito de uma página de jornal e nunca um blogger que dedica o seu espaço à informação terá o crédito de um jornalista que assina a sua peça. Nunca um espírito-livre do jornalismo de rabiscos terá a credibilidade de um jornalista submetido a critérios editorias bem definidos e que segue uma hierarquia de opiniões cuidadosamente estabelecida. Se a ética do jornalista é a ética do cidadão, nunca o cidadão conseguirá colar a sua ética à do jornalista. Há que aproveitar todo o material que o cidadão possa, oportunamente, ter recolhido e então rotulá-lo de noticiável. Esse trabalho é e sempre será do jornalista. Há que deixar ferver a tendência e, como qualquer moda, o seu tempo passará.
É imperativo encorajar sim o cidadão activo, o cidadão atento que tem o discernimento para seleccionar acontecimentos dignos de notícia e colocar o material que recolheu à disposição do verdadeiro jornalista. Encorajar o trabalho de equipa dos profissionais da comunicação com a sociedade que servem. Encorajar as novas tecnologias que patrocinaram uma revolução de acessos e conteúdos. Encorajar o bom funcionamento de uma sociedade, com cidadãos de funções bem definidas e dispostos a colaborar com o próximo.
Por outro lado, não seguimos o caminho do profetismo barato. Não patrocinamos o jornalismo de oportunistas em deterimento do jornalismo de oportunidade. Não podemos apregoar a notícia em cima do joelho e o desrespeito por quem faz da informação o seu sustento e não passatempo.
Porque o trabalho de um jornalista não é leve de responsabilidade, optamos por dar ao passatempo a credibilidade que ele merece.
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